Games for Change, evento norte-americano que promove pesquisa e criação de jogos com engajamento social, será realizado no Brasil, pela 1ª vez, em dezembro
ALEXANDRE ORRICO
DE SÃO PAULO
Você acaba de chegar a Porto Príncipe, recém-destruída pelo terremoto de magnitude 7.0. Voluntário de rede de ajuda humanitária, você:
1) vai ao porto acertar a chegada de suprimentos?
2) procura um caminhão para distribuir mantimentos?
3) percorre a cidade para ver quem precisa de ajuda?
Esse é um dos cenários iniciais de Dentro do Terremoto do Haiti, um dos mais bem-sucedidos projetos do Games for Change, grupo internacional que usa jogos de computador para promover a conscientização social.
Criado nos EUA há oito anos, o G4C já ajudou a desenvolver 155 jogos em que educar é mais importante que matar alienígenas, marcar gols ou conquistar planetas.
É essa proposta que o grupo trará a São Paulo em dezembro, no primeiro evento de pesquisa de jogos do G4C realizado fora dos EUA. “Jogos poderosos são os que ensinam as pessoas”, diz Asi Burak, copresidente da ONG.
Games ambientados na fronteira dos EUA com o México para ensinar alunos sobre imigração ilegal e geografia ou um simulador de cidades, em que o jogador controla um presidente palestino e tem que lidar com o conflito no Oriente Médio são alguns dos exemplos de jogos desenvolvidos que ganharam prêmios do Games for Change.
O evento vem para o Brasil depois que Gilson Schwartz, professor da USP, apresentou ao G4C o game Conflitos Globais (conflitosglobais.com), que também funciona como uma plataforma educativa para salas de aula, com enredos baseados em histórias e locais do mundo real, como Afeganistão e Uganda.
“O Brasil é um país enorme, com uma cultura gamer forte. Vocês têm tudo o que é preciso: jogadores, programadores e empresas dispostas a investir” diz Michelle Byrd, copresidente do G4C.
Segundo Michelle, as redes sociais têm tido um papel importante na popularização dos games com viés social. “O Facebook está ajudando a derrubar a barreira que existe para jogos engajados”, diz.
A executiva credita à rede o crescimento em 50% do evento de 2010 a 2011 -cerca de 800 desenvolvedores participaram do congresso em julho em Nova York.
O festival tenta pegar carona nesse mercado, que tem cerca de US$ 20 bilhões por ano de receita, segundo dados da empresa NPD Group.
No Brasil, segundo dados da Fecomercio (Federação do Comércio) de São Paulo, o setor movimenta R$ 300 milhões ao ano e pode chegar a R$ 3 bilhões por ano até 2015.
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“O uso de jogos é uma tendência para estratégias de desenvolvimento em organizações globais, como o Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas e o Banco Mundial”
MICHELLE BYRD
copresidente do Games for Change norte-americano
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GAMES FOR CHANGE
EM NÚMEROS
ANO DE CRIAÇÃO 2004
ÚLTIMA EDIÇÃO 20 a 22 de junho deste ano
PARTICIPANTES NA ÚLTIMA EDIÇÃO 800 pessoas, 50% a mais do que em 2010
GAMES CRIADOS 155
SITE www.gamesforchange.org
EDIÇÃO BRASILEIRA 5 a 10 de dezembro deste ano
SITE DA EDIÇÃO BRASILEIRA www.gamesforchange.org.br
JOGOS PREMIADOS
FATE OF THE WORLD
www.fateoftheworld.net
Jogo de estratégia em que você tem que salvar o mundo do caos ambiental.
EVOKE
www.urgentevoke.com
Em visual de quadrinhos, o game estimula o jogador a pensar em soluções para os problemas da África
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USP abrigará ‘Campus Party dos games’
Games for Change Brasil, em dezembro, será festival com palestras, workshops e acampamento dos participantes
Versão nacional do evento americano terá concurso de ideias e lançará jogos brasileiros
DE SÃO PAULO
“Será uma espécie de Campus Party dos games”, diz Gilson Schwartz, sobre a versão brasileira do Games for Change, que acontecerá no campus da Universidade de São Paulo, de 5 a 10 de dezembro.
Segundo Schwartz, professor da ECA-USP e diretor da rede Games for Change na América Latina, o evento “terá acampamento dos participantes, além de competições, workshops e palestras”.
Até dezembro, a G4C realiza uma série de encontros preparatórios, para, como afirma o diretor brasileiro, “começar a organizar as pessoas que se interessam por games e mudanças sociais”.
Serão ainda cinco encontros, quatro deles em São Paulo e um na Bahia, em novembro, durante o Simpósio Brasileiro de Game. A programação completa está no site gamesforchange.org.br.
Entre as iniciativas do G4C Brasil está um concurso sobre ideias de games. “É para quem não sabe programar, mas gosta do assunto. Quem sabe não dá para fazer parcerias entre programadores presentes e os donos dessas ideias?”, afirma Schwartz, ex-editorialista da Folha.
“Estamos participando do desenvolvimento de games que serão lançados ainda em 2011 e que envolvem conteúdos ligados a assuntos afro-brasileiros, a economia criativa, a trânsito e a cidadania na metrópole”, completa.
Segundo o diretor, já foram captados R$ 150 mil para a iniciativa nacional. Os parceiros do evento são a Fundação Volkswagen, a AMD Foundation e o consórcio europeu Pro-Ideal.
A cifra mostra como o evento ainda está engatinhando no país. Na Campus Party, só a palestra do ex-vice-presidente americano Al Gore custou mais de três vezes esse valor. Gore também participou da edição norte-americana do Games for Change neste ano.
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SAIBA MAIS
BRASIL TEM 35 MILHÕES DE ‘ATLETAS’
O Brasil é o quarto mercado de games, com 35 milhões de jogadores, segundo a consultoria especializada Newzoo. Os números da Abragames, que reúne desenvolvedores do setor, são maiores: cerca de 42% da população joga games.
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Títulos engajados mostram bons gráficos e enredos
DE SÃO PAULO
Desenvolver um jogo que ensine física ou um que detalhe um acontecimento histórico não é tão difícil.
O complicado é fazer com que o game não perca a principal característica que o torna atraente: a diversão.
Essa foi a questão que tentei responder ao testar alguns dos jogos desenvolvidos sob a batuta do G4C: games com viés social, podem, afinal, ser divertidos e capturar jogadores ‘hardcore’, acostumados com tramas complexas e gráficos impecáveis?
A resposta é mais sim do que não. Há muitos jogos que não conseguem incorporar as informações do “mundo real” mantendo boa dinâmica.
Food Force é um exemplo: os capítulos jogáveis são meras muletas para longas e tediosas apresentações sobre como a fome ainda mata mais do que a tuberculose e a aids.
Mas há ótimos exemplos, como o PeaceMaker, no qual o jogador vive o premiê israelense ou o presidente palestino e deve conseguir um acordo de paz. Os momentos de conflito, que surgem ao longo do enredo, são baseados em fatos reais, e a geografia da região é precisa.
Outro bom título é o belo e complexo LiveEarth, simulador virtual no qual o jogador pode levar o planeta ao desenvolvimento sustentável ou à catástrofe climática. (AO)
Folha de São Paulo, quarta-feira, 07 de setembro de 2011
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